PULP FICTION (1994)
- Bianca R. Matos
- 20 de dez. de 2020
- 5 min de leitura

Após uma pequena pausa de críticas desencadeada por um monte de motivos existenciais, nada melhor do que regressar "em grande"; com um dos clássicos mais influentes e intemporais de toda a indústria cinematográfica. Juntando às recomendações persistentes de alguns dos meus leitores, senti a necessidade (e o interesse) de assistir ao filme mais simbólico de Quentin Tarantino (e que, surpreendentemente, nunca tinha assistido). Talvez por fazer parte de um género que pouca curiosidade me desperta ou por não me ter cativado pela sua sinopse. E a verdade é que Pulp Fiction não nos ensina nada de novo quando o assistimos; porém, se há coisa que este filme me ensinou foi aprender a dar uma oportunidade a todos os géneros, por mais peculiares que sejam para nós.
Pulp Fiction é nada mais nada menos do que uma longa mistura de três histórias paralelas contadas de trás para a frente, de forma inigualável: Um casal de assaltantes que planeia, subitamente, assaltar um café; uma dupla de assassinos que faz cobranças para Marsellus Walace, um poderoso gangster que propõe a Vincent (um dos membros da dupla) sair com a sua mulher, Mia; e um pugilista que ganha uma luta que deveria perder e que, por esse motivo, se mete numa enorme confusão que o põe em perigo. Os caminhos destes criminosos acabam por ficar interligados através de uma ação própria que faz deste um thriller policial tão surpreendente e aditivo, repleto de aspetos interessantes e que, de alguma forma, nos fazem refletir. E aquele que, inicialmente, era suposto basear-se em três curta metragens completamente distintas, acabou por se tornar num dos clássicos mais influentes de todos os tempos.

Um ponto que chama de imediato a atenção do espectador é, sem sombra de dúvida, o elenco; que conta com a fantástica junção de atores incríveis e que marcaram o cinema dos anos 70 e 80, nomeadamente o regresso de John Travolta (conhecido pelo seu papel em Grease), a interpretação fantástica de Samuel L. Jackson (que merecia, na minha opinião, um Óscar), as participações de Uma Thurman e Bruce Willis (que se encontravam no auge da sua carreira) e até a pequena colaboração de Tarantino como Jimmie, um homem caseiro que ajuda, secretamente, a esconder o corpo de um cadáver para impedir o seu divórcio. Todos eles atores talentosos que dão vida ao longa e contribuem para a cativação que a sua narrativa proporciona ao longo das (quase) três horas de filme.
E falando em duração, percebe-se facilmente que o filme é bom quando não se torna monótono por mais horas que a sua narrativa perdure nas telas. É um facto que o ponto alto de toda a história é precisamente o diálogo, recheado de referências e homenagens a alguns elementos que, em certa parte, podem passar por despercebidas mas que acabam por "aliviar" as partes pesadas de toda a trama. A referência à cultura pop é provavelmente a mais notável, nomeadamente no restaurante Jack Rabbit Slim's que Vincent e Mia vão e que é composto por ícones do Pop: James Dean, Marilyn Monroe e Buddy Holly, cena essa eternamente recordada pela famosa dança ao som de You Never Can Tell. Ou os lances passados no carro que homenageiam a carreira jovem de John Travolta em filmes como Grease ou Saturday Night Fever. A referência à Bíblia é também uma das referências feitas ao longo do filme, particularmente no discurso de Jules (personagem interpretada por Samuel L. Jackson) utilizada habitualmente nos seus homicídios (e que, curiosamente, não se refere exatamente a uma verdadeira passagem da Bíblia, mas sim a uma versão adaptada do filme The Bodyguard). As comparações feitas entre a Europa e a América (especialmente na cena do carro após o primeiro homicídio retratado no filme). E até mesmo a referência aos atos medievais: como a cena entre Marsellus e Zed ou a de Butch na escolha de uma arma (na qual acaba por escolher o samurai como arma suprema e superior a qualquer outra). No fundo, todas estas menções (retiradas indiretamente de outras obras) acabam por constituir uma crítica à sociedade e aos costumes que nela se inserem, menções essas acompanhadas por uma banda sonora memorável, escolhida cuidadosamente para cada cena em pormenor.

Mas se há aspeto que realmente impressiona é a capacidade realização de Tarantino e a forma engenhosa com que ele escolhe os diálogos certos em cada parte. É um facto que nunca passaria pela cabeça de qualquer outro realizador criar uma cena de um assassinato na qual fizessem parte diálogos relacionados com hambúrgueres do Mc Donalds ou com um copo meio cheio de Sprite. E aquilo que mais me fascinou em toda a película foi precisamente a capacidade de dialogar e de nos proporcionar uma certa empatia com verdadeiros assassinos - pelo simples facto de presenciarmos as suas conversas banais que qualquer um discutiria em momentos livres dos seus dias, criando uma gradual aproximação entre o público e os personagens. E essa é a principal diferença entre Quentin Tarantino e os outros realizadores de filmes policiais: ele promove os diálogos que, inicialmente, aparentam ser indiferentes na principal fonte de cativação de toda a sua história, ao invés de transitar de imediato para a ação - e só por esse motivo é que Jules se tornou facilmente na minha personagem preferida do filme, que mostra que, por vezes, ser amigável pode ser ainda mais intimidante do que ser agressivo.
Pulp Fiction foi nomeado para numerosos prémios, acabando por ganhar o Óscar de melhor roteiro original e a Palma de ouro. É certo que poderia ter ganho mais, mas a verdade é que 1994 foi um ano fantástico para o mundo cinematográfico, que contou com obras incríveis e intemporais que ainda hoje permanecem vivas nas nossas mentes: Forrest Gump, The Shawshank Redemption, O Corvo, entre outros. Apesar disso, foi o filme que catapultou Tarantino à fama, tornando-o num dos melhores realizadores de sempre. E a prova disso é que, passados quase 30 anos, diversas teorias ainda vão surgindo por parte de fãs do seu trabalho. Afinal, nunca se chegou a descobrir o que estava realmente na mala de Marsellus, sendo esse um dos maiores mistérios de todo o filme. Há quem diga que contém a sua alma, devido ao código (666) e ao brilho irradiado ao abri-la, ou até mesmo o fato dourado usado por Elvis, nos anos 90).

Não é todos os dias que se vê um filme fazer tanto sucesso: seja pelo seu orçamento de produção extremamente baixo, pelas representações, pela história em si, pela dinâmica, pela apresentação individual e original de cada dupla de personagens ou até mesmo pela fotografia e ângulos de filmagem. Algumas das suas cenas ainda permanecem um mistério mas o verdadeiro ponto de toda a situação é que acabamos sempre por retirar alguma coisa de Pulp Fiction (apesar de ter dito inicialmente que não se podia aprender nada de novo). Afinal, onde mais é que descobriríamos que um Quarter Pounder with Cheese também pode ser chamado de Royale with cheese?

Informação Adicional:
Diretor: Quentin Tarantino
Elenco: Quentin Tarantino, John Travolta, Samuel L. Jackson, Uma Thurman, Bruce Willis, Tim Roth, Amanda Plummer, Ving Rhames
Género: Policial/ação
Duração: 178 min.
Classificação: 9/10
Frase favorita: I don't need you to tell me how fucking good my coffee is, okay? I'm the one who buys it. I know how good it is. When Bonnie goes shopping she buys SHIT. I buy the gourmet expensive stuff because when I drink it I want to taste it. But you know what's on my mind right now? It AIN'T the coffee in my kitchen, it's the dead nigger in my garage.
"Juntando às recomendações persistentes de alguns dos meus leitores" ahahaha, ainda bem que gostaste!